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Eu estava pintando umas coisas ontem, umas aquarelas, quando uma menina de uns seis anos veio conversar. Ela mora no mesmo prédio que eu e sempre está atenta aos meus movimentos. Quando pode, vai até meu apartamento. Fica de olho em todos os passos e só para quando se dá conta que eu a vi. Ela ficou ao lado das tintas e quis saber qual era o tema das pinturas. Fiz alguma referência ao que estava sentindo, algo a ver com amor. A menina ficou alvoroçada, começou a fazer desenhos no ar que, a princípio, eu não entendi. Fiquei assustada, mas fui observando até que pude deduzir: ela desenhava duas pessoas se beijando. Eu disse que era isso mesmo e que ela, esperta, havia entendido. Começou, então, a rir e rir e rir até que abraçou minha perna e disse que não queria. Sentei, peguei no colo e disse que acontece de, muitas vezes, a gente não querer alguma coisa, mas que, normalmente, isso passa e dá espaço a outras coisas muito mais interessantes. Fui mudando de assunto até que não houvesse mais nada de empolgante a dizer. Ela mudou o foco e encontrou outras coisas para fazer. Comeu bolo, tomou chocolate quente, leu uns gibis e foi embora. Da janela da sala, vi que ela e sua mãe saíram, logo em seguida, para andar de bicicleta com a meninada da rua. Lá de baixo, ouvi uma vozinha estridente gritar:

– Mar, suas pinturas são muito boas, viu!?